CIRURGIAS DE "NORMALIZAÇÃO" DA APARÊNCIA GENITAL EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES INTERSEXO

NECESSIDADE MÉDICA OU VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS?

Autores

  • Bruna Iglesias Martins de Oliveira Unisanta

Palavras-chave:

intersexualidade humana, cirurgias de , crianças e adolescentes intersexo, direitos humanos

Resumo

O presente trabalho trata da intersexualidade humana devido à invisibilidade do tema no meio acadêmico, inclusive no âmbito dos direitos humanos de pessoas LGBTQIAPN+, no qual as discussões e medidas adotadas costumam concentrar-se nas discriminações fundadas na orientação sexual e na identidade de gênero das pessoas, negligenciando-se as discriminações fundadas na diversidade corporal. Assim, apesar de especialistas estimarem que até 1,7% da população mundial é intersexo, essa condição corporal é pouco debatida pela ciência médica, psicológica e jurídica. Uma das manifestações mais evidentes da intersexualidade humana é uma pessoa possuir uma genitália ambígua ou atípica, isto é, uma genitália que possui tanto características físicas consideradas como sendo do sexo masculino quanto do sexo feminino. A ambiguidade ou atipicidade do corpo intersexo, entretanto, é socialmente vista como um “problema” a ser resolvido, mesmo que a diversidade corporal em questão não represente, na maioria dos casos, um risco à vida da pessoa intersexo. A “correção” do corpo intersexo, então, recai à ciência médica e seus profissionais, que intervém de forma cirúrgica e hormonal para “normalizar” a genitália atípica de pessoas intersexo de maneira a adequá-la aos corpos tidos como masculinos ou femininos. O maior problema dessa intervenção médica, entretanto, é quando ela ocorre antes de a criança ou adolescente intersexo ser capaz de consentir de forma livre e informada com os procedimentos mencionados. Assim, frente à rotineira desconsideração da autonomia de crianças e adolescentes intersexo e frente aos relatos de adultos intersexo que entendem as cirurgias mencionadas como mutilações genitais, este trabalho busca averiguar se – frente aos sistemas onusiano e interamericano de direitos humanos – as cirurgias às quais são submetidos crianças e adolescentes intersexo são fruto de uma necessidade médica ou se violam os direitos humanos de tal grupo social. A pesquisa realizada, então, foi do tipo bibliográfica, buscando-se analisar os principais conhecimentos sociológicos, jurídicos e médicos existentes sobre o tema das cirurgias “normalizadoras” da aparência genital em pessoas intersexo e a sua conexão com os direitos das crianças e dos adolescentes, a partir de publicações em livros, artigos científicos e tratados, convenções, orientações, notas consultivas e demais documentos exarados pelo sistema da Organização das Nações Unidas e pelo Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Considerando-se a pesquisa realizada, pode-se afirmar que, diante dos pareceres de tais sistemas internacionais, não só as intervenções cirúrgicas desnecessárias e sem o consentimento do(a) paciente são uma violação de diversos direitos humanos, como podem ser vistas como uma forma de tortura. Torna-se premente, portanto, que se respeite a integridade corporal e psíquica de crianças e adolescentes intersexo, de forma que a operação genital meramente estética seja uma possibilidade apenas quando a pessoa tiver idade para consentir, de forma livre e informada, sobre o procedimento. Para tanto, recomenda-se, que o Estado brasileiro aja em prol dos direitos humanos de pessoas intersexo e que seja atualizada a Resolução nº 1.664/2003, do Conselho Federal de Medicina, que se encontra defasada, tanto na nomenclatura utilizada, quanto na apresentação do tema da intersexualidade e na abordagem terapêutica propugnada.

Publicado

02.10.2024

Edição

Seção

SIMPÓSIO On119 - DIREITOS HUMANOS NAS PERSPECTIVAS DE GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL