VINCULAÇÃO DO CONCEITO DE FUNDAMENTALIDADE MATERIAL À SOBERANIA POPULAR E AO AGIR COMUNICATIVO COMO CRITÉRIO PARA INTERPRETAÇÃO E REVELAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS EM SOCIEDADES DEMOCRÁTICAS E MULTICULTURAIS
Palavras-chave:
direitos fundamentais, pluralismo, agir comunicativoResumo
O artigo discute, em um cenário de sociedades democráticas multiculturais, a vinculação do conceito de fundamentalidade material à soberania popular e ao agir comunicativo como critério para interpretação de direitos fundamentais catalogados, bem como de revelação de direitos fundamentais outros que defluam dos princípios informativos do sistema de Direito Positivo, de modo a possibilitar uma concretização e desenvolvimento plural do sistema constitucional. A hipótese a ser questionada se refere à possibilidade de submissão da interpretação da abertura constitucional à ação argumentativa democrática como critério para aferição de materialidade fundamental. A metodologia observa a abordagem dedutivo-analítica a partir da técnica de revisão bibliográfica.
O trabalho é justificado pela necessidade de reflexões sobre o agravamento de tensões entre a facticidade e a validade do Direito, potencializada por antagonismos de visões culturais plurais e debates acirrados de espectros ideológicos antagônicos. A abertura da constituição a direitos fundamentais implícitos e a novos direitos fundamentais é típico do movimento neoconstitucionalista e remonta historicamente à IX Emenda da Constituição dos EUA de 1791, que revela a possibilidade de uma leitura de revelação de direitos fundamentais via construção jurisprudencial. A partir desta abertura, normas de direitos fundamentais passam a resultar não apenas da sua fundamentalidade formal, mas também e de sua fundamentalidade substancial, de modo que cabe inquirir quais os critérios legítimos para a definição de um conteúdo material de um direito fundamental. Tal questionamento é mormente relevante em sociedades multiculturais, nas quais não mais se pode valer homogeneamente da justificativa religiosa e pós-metafísica como fundamento normativos ou moral do Estado, de modo que a fundamentação exclusivamente racional serve de única causa legitimadora do conceito de direitos fundamentais materiais, tomando por premissa o conceito kantiano segundo o qual cada ser racional é um fim em si mesmo simplesmente por sua essência, que lhe confere capacidade moral se portar como legislador de si mesmo.
Neste sentido, conforme Habermas, depois da fragmentação das garantias metassociais fornecidas pela autoridade religiosa, o que empresta durabilidade legítima a normas jurídicas é a expectativa de poderem ser contestadas e reelaboradas segundo o livre convencimento de seus destinatários em uma prática cooperativa de auto legislação.
Essa necessidade de legitimidade discursiva é notadamente necessária em temas que escapam da adequação ao caráter histórico-cultural. Em consonância com esse vínculo material entre direitos fundamentais e autodeterminação popular, a partir da teoria do discurso e da soberania popular, tomamos como premissa material dos direitos fundamentais a fundamentação de iguais pretensões à participação nos processos democráticos de legislação. Outrossim, concluímos com base em Habermas que a interpretação de direitos fundamentais em sociedades democráticas multiculturais não pode ser fruto de simples reflexo de direitos morais, mas do exercício da ação argumentativa que faça valer de forma equilibrada a autonomia privada e pública dos cidadãos. Deste modo a materialidade dos direitos fundamentais será perceptível naqueles direitos que os cidadãos se atribuem mutuamente ao regular a legitimidade de sua convivência com o meio do direito positivo, como resultado de seu poder comunicativo.