ATRAVESSAMENTOS DA TRIPLA OPRESSÃO E PACTO DA BRANQUITUDE NO CAPITALISMO DEPENDENTE BRASILEIRO

ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NA PRECARIZAÇÃO DA VIDA LABORAL NEGRA

Autores

  • Helena Pontes dos Santos Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

Palavras-chave:

PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE EMPREGO, TRIPLA OPRESSÃO, INDIGNAÇÃO NARCÍSICA, CAPITALISMO DEPENDENTE, TERCEIRIZAÇÃO

Resumo

O presente trabalho objetiva analisar a figura precarizante chamada de terceirização e sua legitimação pelo Judiciário Brasileiro, desde o enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho brasileiro - que introduziu a possibilidade de terceirização em alguns trabalhos, chamados atividade-meio – até as decisões jurisprudenciais ADI 5685 e ADPF 324 - ações nos quais se questionou junto ao Superior Tribunal Federal brasileiro a constitucionalidade da terceirização irrestrita – sem ignorar a necessidade de se historicizar tal fenômeno a partir de epistemologias subarternizadas. Se historicizarmos como é devido, encontraremos a intermediação de mão de obra presente da vida de mulheres racializadas desde o período a que Clóvis Moura denomina escravismo tardio, não havendo nenhuma novidade na técnica de gestão de pessoal. Durante o regime militar se insere no serviço público brasileiro justamente em trabalhos historicamente relacionados a pessoas trabalhadoras membras de minorias políticas.

A Lei n° 13.467/2017 (chamada reforma trabalhista) e a legalização da terceirização irrestrita não significaram para essas pessoas trabalhadoras, membras de minorias políticas, perda do patrimônio justrabalhista. Elas já experimentam este rebaixamento há séculos. O que se deu com tais implementações precarizantes foi o nivelamento por baixo dos direitos trabalhistas e, por consequência, dos direitos humanos. Ocorre que no Direito do Trabalho, quando tratamos de figuras precarizantes, as análises partem sempre do mesmo lugar, ou seja, do experimentado pelo trabalhador tido como “sujeito universal” – homem, cis gênero, pessoa sem deficiência, branco, heterossexual - excluindo-se a história dos grupos oprimidos. Se para o “sujeito universal” a “reforma” trabalhista (Lei n° 13.467/2017) e a legalização da terceirização irrestrita (Lei nº 13.429/2017) são perdas, para a classe trabalhadora ela é o resultado da ausência da solidariedade de classe trabalhadora fomentada por ideologias – como o racismo, machismo e outras opressões - que a fragmentam. Foi assim que a terceirização – que existe para justificar o não reconhecimento de vínculo direto entre o/a tomador/ora de serviço e a/o empregada/o, barateando o custo com a compra de força de trabalho necessária ao funcionamento do empreendimento capitalista, deixando o passivo que gerará o descumprimento da legislação para empresa interposta a qual não tem condições de arcar não raramente – foi aceita para atividade-meio. Daí a necessidade de se debruçar no processo histórico legal e jurisprudencial a partir de outros referenciais teóricos, que rompam com o universalismo branco. É às luzes da metodologia da encruzilhada gênero, raça e classe e do materialismo histórico dialético, que se propõe revelar a clara faceta da branquitude acrítica, que somente se mobiliza quando tais “inovações” jurídicas passam a ser experimentadas por seus pares de raça: o que Cida Bento nomeia “indignação narcísica”. Considera-se que no capitalismo dependente e periférico, os corpos femininos e racializados estão para a precariedade desde sempre e que o Direito do Trabalho e as decisões da Poder Judiciário serviram a naturalização da precarização, embasaram a legalização e aceite de tal condição como inevitável e extensível a toda a classe trabalhadora.

Publicado

02.10.2024

Edição

Seção

SIMPÓSIO On117 - A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO CONTEMPORÂNEO: RACISMO E SEXISMO COM