MAGNA CARTA E POLÍTICAS PÚBLICAS AUSTERITÁRIAS

ONDE FICAM OS DIREITOS DAS CRIANÇAS?

Autores

  • Manuel Menezes Instituto Superior Miguel Torga; ICNOVA - Instituto de Comunicação da Nova

Palavras-chave:

Austeridade, Crianças, Risco/Perigo, Convenção, Direitos

Resumo

Na presente comunicação pretendemos dar conta de alguns dos resultados obtidos no âmbito da pesquisa desenvolvida no Doutoramento em Serviço Social realizado no ISCTE-IUL, cujo objeto de estudo incidiu sobre as práticas do Serviço Social no Sistema de Promoção e Proteção à criança em Portugal. Partimos da análise da Convenção sobre os Direitos da Criança, a Magna Carta que consagra a criança enquanto sujeito de direitos. Em concreto, problematizamos os quatro princípios orientadores da intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança nela previstos, designadamente os princípios da (i) não discriminação, do (ii) interesse superior da criança, do (iii) direito à participação e do (iv) direito à vida, sobrevivência e desenvolvimento. Sabendo que a ratificação da Convenção responsabiliza juridicamente os países no sentido de não só reconhecerem os direitos, mas também desencadearem ações tendo em vista a sua proteção, buscamos mostrar como as políticas públicas de austeridade, adotadas no nosso país entre 2011 e 2014, complexificaram o papel e evidenciam um descomprometimento de Portugal ante essa mesma responsabilidade. De entre as consequências humanas decorrentes das políticas públicas implementadas, focamo-nos, primordialmente, nas situações experienciadas pelas crianças inseridas em famílias de menores rendimentos, visando compreender como a supressão de direitos, redução de salários/pensões, o aumento de impostos, do desemprego, a diminuição da proteção social, colocando em causa a promoção do bem-estar dos portugueses, contribuíram para o aumento das situações de risco/exclusão dos cidadãos em geral e das crianças em específico. Visando o cumprimento dos objetivos delineados, metodologicamente, a opção recaiu numa abordagem de cariz qualitativo, com recurso, por um lado, a uma revisão sistemática e consistente da literatura produzida sobre o assunto em pauta, disponível em bases de dados científicas e, por outro, à exploração, análise e sistematização de indicadores estatísticos nacionais e europeus. Na sua dimensão empírica, o estudo integrou as 100 CPCJ instaladas nos distritos de Aveiro, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria e Viseu. Para a recolha de informação: (i) aplicámos um inquérito por questionário (online), no qual participaram 85 assistentes sociais em representação de 62 CPCJ e (ii) realizámos um grupo focal com 11 assistentes sociais de oito CPCJ. Sinalizando com especial acuidade a situação das crianças, foi possível concluir que, na sua dimensão social, o período analisado foi muito negativo. Os diferentes indicadores tomados em consideração evidenciam uma deterioração das condições de vida da população, e o aprofundamento dos défices de bem-estar das crianças e suas famílias. Os resultados corroboram não só os contributos das políticas públicas austeritárias para o recrudescimento das situações de perigo vivenciadas pelas crianças, mas também a ideia de terem sido elas a sofrer o maior impacto das políticas adotadas em Portugal. Em razão do referido, ficou, igualmente, claro que as opções políticas adotadas durante o período de execução do PAEF contribuíram para o colocar em causa e/ou violação de alguns dos direitos mediadores dos princípios orientadores da Convenção e, por consequência, para a exclusão do acesso aos mesmos por parte das crianças portuguesas.

Publicado

02.10.2024

Edição

Seção

SIMPÓSIO On108 - OS DIREITOS HUMANOS COMO QUADRO MORAL E ÉTICO NO SERVIÇO SOCIAL