EMPRESAS TRANSNACIONAIS E TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO

ANÁLISE DOS CINCO ANOS DA LEI FRANCESA DO DEVER DE VIGILÂNCIA

Authors

  • Lucas Reis da Silva Pontifícia Universidade Católica do Paraná

DOI:

https://doi.org/10.29327/1163602.7-540

Keywords:

DIREITOS HUMANOS, EMPRESAS TRANSNACIONAIS, TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO, CADEIAS DE FORNECIMENTO, DEVER DE VIGILÂNCIA

Abstract

A lei francesa que instituiu o dever de vigilância é considerada uma luz no fim do túnel contra a impunidade de empresas transnacionais que violam direitos humanos. A tragédia de Rana Plaza em Bangladesh em 24 de abril de 2013 provocou uma reação mundial. Na França, foi aprovada, em 2017, a Lei n.º 2017-399 sobre o dever de vigilância das empresas controladoras – as beneficiárias finais da cadeia de valor. Aplica-se a empresas e grupos que, com sede na França, empreguem mais de 5.000 trabalhadores por dois anos consecutivos ou que, mesmo com sede fora do território francês, operem naquele país e contem com mais de 10.000 empregados. Tais empresas ou grupos devem estabelecer, publicar, respeitar e avaliar um Plano de Vigilância que comporte toda sua cadeia de fornecimento, sob pena de responsabilidade. Este plano pode contribuir com o enfrentamento do trabalho escravo contemporâneo e sua ocorrência em redes, em cadeias de valor. Ele visa identificar riscos e prevenir graves violações de direitos humanos e liberdades fundamentais, saúde e segurança das pessoas e meio ambiente em toda a sua esfera de influência, compreendendo inclusive suas subsidiárias e subcontratadas. Esta lei é útil para promover e fortalecer a responsabilidade social corporativa e torna a França uma nação pioneira. A experiência francesa pode inspirar alterações legislativas em todo o globo. Os compromissos das empresas e os princípios resultantes da "soft law", em particular os das organizações internacionais (OIT, OCDE ou ONU), têm "força de lei" na França e, por extensão, em todos os países onde a subsidiárias e subcontratadas dos maiores grupos franceses. Entretanto, cinco anos depois de sua aprovação, algumas empresas ainda não cumprem formalmente todas as obrigações previstas na lei. Caminhos de progresso ainda estão abertos para sua ascensão gradual ao poder. Em 2019, a “Total” foi a primeira empresa a arcar com o peso da lei sobre o dever de vigilância das multinacionais, em vigor desde março de 2017. “Les Amis de la Terre” et “Survie”, duas ONGs francesas que atuam na defesa dos direitos humanos, denunciaram a empresa petrolífera “Total” por violação à lei do dever de vigilância sob o fundamento de que o plano de vigilância implementado pela empresa descumpre a lei 399-2017. Em 2021, onze associações, entre elas algumas representantes de povos indígenas da Amazônia brasileira e colombiana, processaram, na França, o grupo de supermercados Cassino (que administra, entre outros, a rede “Pão de Açúcar” no Brasil) pelos mesmos motivos. O objetivo do presente artigo é avaliar, a partir de estudos de casos concretos, a aplicação e o alcance da lei francesa do dever de vigilância e compreender sua efetividade e os desafios que a ela se impõem. A partir da análise desses casos concretos, busca-se compreender de que maneira o ordenamento jurídico francês e a lei do devoir de vigilance podem impactar o combate ao trabalho escravo no Brasil.

Published

2022-12-31