CAPITALISMO E POLÍTICA JUDICIAL ANTIMANICOMIAL NO BRASIL
Keywords:
ANTIMANICOMIAL; MENTAL; CRIMINAL; CAPITALISMO; PODER JUDICIÁRIOAbstract
Opressão é uma palavra que possui muitos significados na luta antimanicomial. É a reação da sociedade ao conferir poder de segregação ao tido espaço do internamento, nos hospitais gerais, organizando, assim, aqueles tidos como “a-sociais”, não só aos doentes mentais, como eram chamados, mas também a todos aqueles que não se enquadravam dentro do comportamento esperado daquela época pela sociedade. Cria-se instituições com participação da igreja, não para tratar ou curar as pessoas que ali estivessem internadas e, sim, para desempenharem um papel ao mesmo tempo de assistência e de repressão (FOUCAULT, 2012, p. 52), o gesto que aprisiona não é mais simples: também ele tem significações políticas, sociais, religiosas, econômicas e morais (FOUCAULT, 2012, p. 53). Verdadeiros asilos, exílios, prisões que viam no isolamento a terapia ideal aos comportamentos desviantes, onde os alienados, os idiotas e os imbecis eram tratados de acordo com as suas posses (MOREIRA (1905), 2011, p.730). Nasce então um sujeito que, a partir de sua insanidade, sustenta sua existência, o louco (KREIN, 2020, p. 96), que não pode se expressar em sua plenitude, surgindo, então, a desigualdade, o conflito, intrínsecos ao sistema capitalista. Onde o poder do Estado moderno dissolveu a dignidade pessoal no valor de troca e substituiu as muitas liberdades, conquistadas e decretadas (MARX; ENGELS, 2008, p. 14). Não há espaço para os que “não servem” para reproduzir a lógica de acumulação do capital, para aquelas e aqueles cuja vida não se encaixa dentro dos padrões impostos, cuja força de trabalho não possa ser vendida e extraída até a última gota de sangue ou suor (AGUIAR, 2020, p.24), o capitalismo articula a coerção e o consenso. A política antimanicomial do Poder Judiciário, como é chamada a resolução 487/2023 do Conselho Nacional de Justiça, trata das consequências e não das causas da saúde mental e dos atos criminosos praticados. Desinternar não é uma palavra com significado vazio, há responsabilidades em tal ato, já que significa dar autonomia não só jurídica, mas também econômica e social, ao encaminhar este alguém para algum lugar atendendo o princípio da dignidade humana, sem violar mais os seus direitos fundamentais, caso contrário, estará apenas deslocando o problema da falência sistêmica do sistema penitenciário. É preciso vislumbrar a saúde mental no contexto da luta de classes, já que o rótulo criado pela sociedade tem papel importante na classificação e exclusão dos “inaptos” para a produção e, consequentemente, para a convivência social em uma sociedade organizada de acordo com os princípios do sistema de produção capitalista. Em suma, a política antimanicomial imposta pelo e ao poder judiciário, com a resolução do CNJ deve priorizar não apenas, consertar o estado de coisas inconstitucionais, nos termos da ADPF 347 (STF), a eficiência do sistema de justiça criminal, mas também o respeito aos direitos sociais e à dignidade das pessoas com transtornos mentais. Somente assim será possível avançar em direção a uma abordagem mais humanitária e eficaz para lidar com essa complexa questão.