DIREITO, VIOLÊNCIA E INDIFERENÇA MORAL NO FILME ZONA DE INTERESSE
Palavras-chave:
DIREITO, MORAL, CINEMA, VIOLÊNCIAResumo
Neste estudo, objetivamos refletir sobre temas que envolvem questões de direitos humanos, a partir do diálogo interdisciplinar entre Direito e Arte. Este caminho é de muita relevância acadêmica porque permite aprofundar nossa cognição e penetrar na obscura consciência subjetiva humana, ligada a mecanismos morais que sustentam a legitimidade jurídico-política. Esta consciência não é alcançada, de forma profunda, apenas pela leitura teórica tradicional, pois ela não consegue atingir o campo da moralidade humana mais obscuro, por estar mais conectada a elementos racionais mais aparentes da vida social. Objetivamos demonstrar como um bom filme de arte, em diálogo com teorias jurídicas críticas, consegue agregar elementos de sensibilidade impactantes na cognição de temas de direitos humanos. Como hipótese da leitura teórica, nos valemos do pensamento de Hannah Arendt, que desenvolve, com toda a originalidade, a tese de que o funcionário nazista Adolf Eichmann não deveria ser encarado como um criminoso perverso, mas apenas como um indivíduo que incorporou a chamada banalização do mal, que impôs a máxima moral do dever de obediência jurídica formal alheia aos conteúdos normativos concretos. Ele foi uma peça sem destaque na engrenagem da burocracia, que passou a encarar a violência como regra, como uma espécie de rotina naturalmente aceita por todos. Em termos metodológicos, desenvolveremos a reconstrução narrativa desta realidade dramática, em torno da banalização do mal, a partir da associação interdisciplinar do pensamento filosófico- jurídico de Giorgio Agamben e Hannah Arendt com o premiado filme Zona de Interesse (The Zone of Interest, Jonathan Glazer, 2023). Nesta leitura interdisciplinar, assumimos a hipótese inicial de que a película pode ser interpretada como uma poderosa reconstrução imagética da memória narrativa de uma zona de irresponsabilidade moral percebida nos funcionários do regime nazista. O filme se inspira em fatos reais e mostra o cotidiano familiar daqueles indivíduos que trabalharam na organização burocrática nazista e habitavam uma luxuosa casa contígua ao campo de Auschwitz-Birkenau. Expõe, de forma impactante, esta vivência íntima do mal banalizado, extremamente violento, e da indiferença moral diante do extermínio de vidas humanas. Nas conclusões, analisaremos como o filme complementa as análises de Agamben e Hannah Arendt, a partir de ângulos de observação estéticos que nos posicionam a acompanhar a intimidade da vida familiar que naturalizou a violência abusiva sem limites, presente no campo de concentração, que ocorria do outro lado do muro. E também pensaremos sobre a atualidade desta reflexão em situações contemporâneas, de grande violação aos direitos humanos, onde podem ser observadas a generalização da indiferença moral, diante da violência extrema, e o desvalor do ser humano.