CRÍTICA DO PROCEDIMENTAL IDEOLÓGICO DA LEI DO ESTÁGIO
Palavras-chave:
Forma jurídica, Ideologia, Lei do estágio, Luta de classesResumo
No começo do ano de 2023, um fato sensível – uma tentativa de suicídio por parte de um estagiário de direito de um grande escritório de advocacia – voltou as atenções do mundo jurídico à questão das condições de trabalho do contrato de estágio. Sabe-se, desde muito, da penúria da qual jovens estudantes de direito dispõe para vender sua força de trabalho para o grande capital: jornadas extenuantes, abusos psicológicos, falsas promessas, remuneração pífia, enfim, a lista é extensa. Tudo isso ganha em dramaticidade quando se tem em vista que o processo de trabalho em tela é responsável por grande parcela do movimento da forma jurídica, pontualmente, de sua legitimação teórica e prática. Cuida-se de operários que hão de ocupar, após o devido processo de formação, os mais sofisticados postos de quadros do capital. Daí a importância do artigo para o debate: trata-se não só de proceder à denúncia da violência da exploração de uma mão de obra assalariada precarizada, mas, sobretudo, de compreender como a ideologia jurídica penetra especificamente nesse processo e, dado que há nele sua operacionalização, compreender como ela é alargada pelo manejo do direito na advocacia. Para tanto, o artigo se vale do instrumental epistemológico do materialismo histórico-dialético, fundamentado na crítica da forma jurídica estruturada por Evgeni Pachukanis, com a modalidade procedimental que lhe atribuiu Edelman, consistente em formular desenvolvimentos teóricos a partir da crítica imanente de decisões judiciais. Tal a fim de que, ao final, possa-se plasmar a totalidade – no sentido de eixo – da realidade do estágio, enquanto vínculo empregatício, e de sua crítica, enquanto crítica das condições de produção capitalistas. Nesse sentido, após ter deixado o tema introduzido, o artigo incorre na descrição da ideologia jurídica e da ideologia burguesa do trabalho, a fim de contextualizar os principais móveis da estruturação de uma relação empregatícia nefasta e catastrófica à organização classista dos trabalhadores. Pretende-se notar os principais alicerces de ambas as ideologias e também conectá-los com a realidade dos operários do direito e de seus processos de trabalho. Isso posto, o artigo estará apto a proceder à análise dos principais textos jurídicos que tomam o estágio por objeto. Importa não só fixar as considerações acerca do principal enunciado normativo, a lei nº 11.788/2008, mas, sobretudo, investigar enunciados jurisprudenciais que discutem a lei do estágio. Com isso, pretende-se que as manobras da forma jurídica para esconder a exploração capitalista e, mormente, a contratualização dessa força de trabalho, fiquem devidamente denunciadas. Nessa direção, deve-se fazer sentir a movimentação do conceito de subsunção hiper-real do trabalho ao capital, tal como o desenhou Marcus Orione. O último momento do desenvolvimento do artigo terá de ser categórico em demonstrar a relação dialética entre luta de classes e a reprodução da própria existência por parte dos trabalhadores do direito. Aqui se pretende desfazer os mitos narrados pela forte aliança entre ideologia jurídica e ideologia burguesa do trabalho, sem, contudo, furtar-se de alertar para os riscos que práticas reiteradas produzem à corporalidade e à subjetividade da classe trabalhadora.