A INCORPORAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E A EQUIDADE DE GÊNERO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

AS POSSIBILIDADES E OS DESAFIOS DA DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO CASO FAVELA NOVA BRASÍLIA VS. BRASIL

Autores

  • Cintia Morgado B Mendes Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro

Palavras-chave:

EQUIDADE; GÊNERO; VIOLÊNCIA; ESTADO; DIREITOS

Resumo

Era uma vez uma bela mulher mortal acusada de profanar o templo da deusa Atena após ter sofrido violência sexual pelo deus Poseidon. Como punição, foi transformada na monstruosa górgona Medusa. O mito grego citado contempla expressões do mundo e do ser humano, herdadas de vivências acumuladas de gerações antecedentes, que preservam hodiernamente a estigmatização do feminino. Contrariamente ao acolhimento, vislumbra-se a revitimização da mulher. O caso FAVELA NOVA BRASÍLIA vs. BRASIL, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, ilustra emblematicamente o objeto do estudo. Durante incursão policial naquela localidade, três mulheres, duas delas menores, teriam sido vítimas de tortura e de violência sexual pelos agentes estatais e de violência institucional diante da inadequada investigação policial. Destaca-se a determinação pela Corte de implementação de programa ou curso permanente e obrigatório sobre atendimento a mulheres vítimas de estupro para policiais e funcionários de atendimento de saúde. Assim, a partir de pesquisa documental, e pelo método lógico-dedutivo, o trabalho objetiva contemplar a relação entre violência e desigualdade de gênero, presentes na cultura da sociedade e das instituições públicas, bem como refletir acerca das possibilidades e dos desafios do concerto entre incorporação dos direitos humanos e perda da centralidade do Estado na concepção e condução de atividades administrativas. A relevância do tema encontra fundamento na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – “Convenção de Belém do Pará” e na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas - ONU, que incorporou dezessete Objetivos de Desenvolvimento Sustentável - ODS. Qualquer tipo de violência contra a mulher impede e anula o exercício dos demais direitos humanos a ela consagrados, assim como a manutenção da desigualdade de gênero acentua vulnerabilidades. Destarte, como hipótese inicial entende-se que a Administração Pública, incumbida da tarefa de proteção dinâmica dos direitos, ao conceber políticas de equidade de gênero, deve incluir práticas educativas que promovam ambientes livres de discriminação, esteriótipos ou subordinação, evitando a violência institucional pelo uso imprudente da força e a vitimização secundária nos processos de investigação e judicialização em episódios de violência sexual. Ainda sobreleva nesse cenário a incorporação dos direitos humanos decorrentes de tratados internacionais ao ordenamento jurídico nacional em razão da inédita abertura da Constituição Brasileira de 1988. E na medida em que a atuação pública deve ser concebida e executada à luz dos direitos, constata-se o fenômeno da globalização jurídica e da sociedade de rede, pois a fonte do direito administrativo passa a ser plural, fragmentada e difusa. Por fim, a competência jurisdicional da Corte Interamericana, ao interpretar e solucionar controvérsias, com base nas normas incorporadas de direitos humanos, acrescenta uma nova camada às referências de atuação da Administração Pública na contemporaneidade.

Publicado

02.10.2024

Edição

Seção

SIMPÓSIO P24 - POLÍTICAS DE EQUIDADE E O TRATAMENTO DOS DIREITOS NOS CAMPOS DA E