UMA RELEITURA DA DECISÃO DA CIDH NO CASO GONZÁLEZ E OUTRAS VS. MÉXICO À LUZ DOS DIREITOS HUMANOS E EMPRESAS

A RESPONSABILIDADE DAS INDÚSTRIAS MAQUILADORAS NO AUMENTO DA VIOLÊNCIA DE GÊNERO

Autores

  • Júlia Lambert G. Ferraz Universidade de São Paulo

Palavras-chave:

DIREITOS HUMANOS E EMPRESAS, VIOLÊNCIA DE GÊNERO, CIDH, REPARAÇÃO

Resumo

O caso González e Outras vs. México marcou a jurisprudência internacional ao abordar o feminicídio e a violência de gênero de forma sistêmica. A decisão responsabilizou o Estado mexicano por sua falha em proteger mulheres de uma série de assassinatos e violências sexuais ocorridos em Ciudad Juárez, reconhecendo a morte de mulheres por sua condição de gênero. Durante o julgamento, as indústrias maquiladoras foram identificadas como um fator crucial para o aumento da violência de gênero na região. Estabelecidas após a entrada em vigor do NAFTA, essas empresas preferiram contratar mão de obra feminina, alterando significativamente as dinâmicas de poder e os papéis de gênero. Em um contexto econômico fragilizado, com altas taxas de desemprego entre homens, a contratação feminina aumentou as tensões sociais e levou a um aumento significativo da violência de gênero. Embora o México tenha sido responsabilizado pela CIDH pelas falhas e omissões nas investigações dos assassinatos, não houve medidas específicas voltadas para as empresas. Sabe-se que a responsabilização perante as cortes internacionais é direcionada aos Estados e não diretamente às empresas. No entanto, nos últimos anos, a CIDH tem reconhecido, com base nos Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos da ONU (2011), a necessidade de que as empresas ajam de maneira responsável e a obrigação dos Estados de cobrar essa atuação. Diante desse contexto, o presente artigo tem como objetivo analisar o julgamento do caso González e Outras vs. México à luz dos direitos humanos e empresas. Embora, na época do julgamento do caso (2009), os Princípios Orientadores ainda não tivessem sido criados, a análise do caso pode revelar os limites das reparações internacionais por violações de direitos humanos com relação a atores não estatais e, além disso, verificar possíveis portas de entrada e oportunidades para a consideração destes atores a partir do novo paradigma construído a partir de 2011. Para tanto, o artigo será desenvolvido em duas etapas. A primeira consiste em uma análise do caso, identificando como a CIDH construiu o argumento em relação às causas das violações em Ciudad Juárez e comparando as causas com as medidas de reparação estipuladas. Pretende-se entender quais aspectos causais do agravamento da violência de gênero foram, de fato, abordados pela decisão e quais não se refletem nas medidas de reparação. Em uma segunda etapa, com base em julgados mais recentes da CIDH que reconheceram a necessidade de os Estados cobrarem de suas empresas uma atuação responsável, serão propostas possibilidades reparatórias que poderiam ter sido pensadas no caso mexicano.

Publicado

02.10.2024

Edição

Seção

SIMPÓSIO On40 - REPARAÇÃO POR VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E SISTEMA DE JUSTIÇA: