DIFERENTES, MAS IGUAIS
A PROIBIÇÃO À DISCRIMINAÇÃO COM BASE NA ORIENTAÇÃO SEXUAL PELO DIREITO PENAL NO SISTEMA EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS
Palavras-chave:
HOMOSSEXUALIDADE, DIREITO PENAL, DIREITOS HUMANOS, DISCRIMINAÇÃOResumo
Há séculos, minorias sexuais são marginalizadas e reprimidas em diversas sociedades, e são utilizados diferentes campos para a perseguição desses grupos, incluindo a religião, medicina e o direito. Esse último, em verdade, parece desempenhar um papel central no controle e repressão de coletivos indesejados, e o direito penal ganhou destaque nessa função. Mesmo sendo o ramo jurídico com as intromissões mais severas nas vidas dos indivíduos, são abundantes os exemplos de sua utilização para lidar com atos tão íntimos e privados como atos sexuais consentidos entre adultos do mesmo sexo, podendo ser encontrados desde legislações antigas, como as Ordenações do Reino de Portugal, até em mais de 60 países membros da ONU. De fato, foi apenas em anos mais recentes, precipuamente a partir da segunda metade do século XX, que se começou a olhar de outra maneira para o tratamento conferido à homossexualidade pelo direito penal, em especial com o desenvolvimento do direito internacional dos direitos humanos. Nesse sentido, tais direitos passaram a ser mobilizados para questionar o uso do direito penal para discriminar minorias sexuais, e, dentre eles, o da igualdade associado à proibição de discriminações ganha considerável relevância principalmente para afastar diferenciações nas idades mínimas de consentimento. Isso, porque muitos países, apesar de “tolerarem” condutas homossexuais masculinas, prescreviam idades diferentes para tais atos quando comparadas às previsões para práticas heterossexuais ou entre mulheres. Assim, o sistema europeu de direitos humanos foi chamado a analisar questões dessa natureza em distintas oportunidades, e, embora tenha precedentes mais antigos admitindo o tratamento discriminatório, mais recentemente consolidou o entendimento de que ele é incompatível com a Convenção Europeia de Direitos Humanos, em especial com seu artigo 14 em conjunto com o 8º. Nessa esteira, esta pesquisa objetiva analisar criticamente as decisões oriundas do sistema europeu a respeito da proibição à discriminação como fator impeditivo ao estabelecimento de idades de consentimento diferentes para atos sexuais consentidos entre homens. Para tanto, objetiva-se delinear os principais argumentos das decisões para superar entendimentos anteriores e estabelecer um novo paradigma não-discriminatório no direito penal no tocante à regulação da homossexualidade. Com isso, podem ser apreendidas as argumentações utilizadas para afastar tratamentos desiguais por meio da justiça criminal, permitindo a elaboração de estratégias de resistência em casos semelhantes, o que ganha considerável relevo em um contexto em que diversos Estados ainda hoje contam com normas penais discriminatórias. Nesse ponto, cumpre também destacar que as decisões do sistema europeu possuem grande influência mesmo fora da Europa e já foram mencionadas em julgados relacionados à descriminalização de condutas homossexuais, como Lawrence v. Texas, nos EUA. Logo, o estudo desses precedentes também se mostra oportuno por sua capacidade de influenciar outras decisões de países diversos.