A DESIGUALDADE SOCIORRACIAL E A PANDEMIA DO COVID-19
OS EFEITOS DA NECROPOLÍTICA BRASILEIRA NA GESTÃO SANITÁRIA DE ENFRENTAMENTO AO CORONAVÍRUS
Keywords:
Desigualdade; Necropolítica; Pandemia; Vulnerabilidade Sociorracial.Abstract
A pandemia do Covid-19 revelou a instabilidade do direito sanitário das nações, em razão da crescente curva de contaminação e do número de mortos. Diante desse cenário de incertezas, a Organização Mundial da Saúde (2020) recomendou aos países a adoção de medidas sanitárias de distanciamento social e de higienização para dirimir o impacto do coronavírus na realidade social e evitar o colapso dos sistemas de saúde. No cenário brasileiro, a contaminação do coronavírus se deu de forma exponencial, revelando a dificuldade do sistema de saúde de ofertar leitos e assistência sanitária adequada para toda a população. Nessa conjectura, a disfuncionalidade do sistema de saúde desnuda as deficiências de prestações sociais de forma igualitária, em um contexto de vulnerabilidade sociorracial, que diferencia os sujeitos pelas fragilidades econômicas e pelas marcas do racismo estrutural que estão enraizados na formação do Estado brasileiro. Nessa perspectiva, observa-se que, apesar da abolição da escravidão já ter sido consolidada no Estado de Direito, as amarras do racismo nunca foram superadas e se reverberam na realidade contemporânea. No cenário do pós-abolicionismo, observamos que os negros deixaram de ser objetivados como mercadorias, mas passaram a ser vulnerabilizados e desassistidos do exercício dos seus direitos fundamentais na sociedade contemporânea. Tais conjunturas conduzem ao processo de necropolítica do Estado brasileiro, que discrimina e exclui os povos negros das políticas assistenciais e os colocam à margem social. Na realidade pandêmica, os efeitos necropolíticos ganham contornos ainda mais desastrosos, uma vez que o racismo estrutural tem pautado o direcionamento das políticas públicas assistenciais para a elite branca, restando aos negros e pobres à exclusão social, em um processo de invisibilização, destinados às zonas de esquecimento da estrutura social. Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo analisar os impactos das desigualdades sociorraciais e os efeitos necropolíticos na gestão da pandemia do coronavírus no Brasil. Cumpre salientar que, diante da possibilidade do colapso de saúde no contexto europeu, foi autorizado a realização da “Escolha de Sofia”, como a decisão difícil de escolher entre vidas, devendo dar preferência para a população mais jovem, por um critério etário. Quando nos deparamos com o cenário de desigualdade sociorracial brasileira, observamos que a “Escolha de Sofia” é necropolítica, determinando os povos que terão acesso ao direito à saúde e restando aos povos estruturalmente marginalizados à eliminação de seus corpos, em uma verdadeira tragédia humana. Por esse contexto, a presente pesquisa se justifica na necessidade de demonstrar os dilemas e desafios da sociedade brasileira para a promoção da igualdade efetiva do direito sanitário na gestão da pandemia do coronavírus, a partir da investigação do percurso histórico de formação social do país, a fim de desmistificar a estrutura simbólica do racismo e das desigualdades dos povos. Para delinear a presente proposta, o estudo fará uma análise sistemática dos dados estatísticos do racismo estrutural e dos efeitos da necropolítica na realidade da pandemia do coronavírus no país. Ademais, a incursão teórica utilizará uma abordagem crítico-reflexiva sobre os entraves necropolíticos para a concretização do direito sanitário no Estado Democrático de Direito.